Setor imobiliário deve começar a ver melhora em 2020

Estimativa é do economista Samuel Pessôa, que traçou um panorama das propostas e desafios dos candidatos à presidência.

17 de setembro de 2018Mercado Imobiliário
Independentemente de quem seja o novo presidente da República, o ajuste fiscal terá de ser feito, sentencia um dos mais renomados economistas brasileiros. "Tenho certo otimismo com qualquer candidato. O problema maior, que é nosso conflito distributivo, vai rumar para uma solução. Ela pode mais ou menos satisfatória, mas, no futuro, teremos tempos melhores do que os que estamos vivendo agora", diz Samuel Pessôa.

Ele, que é sócio da consultoria Reliance, pesquisador associado do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV) e colunista da Folha de S.Paulo, participou do GRI Loteamentos & Comunidades Planejadas 2018 em setembro e teceu um panorama das propostas e desafios dos presidenciáveis e do próximo mandatário nacional.

Quanto ao cenário para o mercado imobiliário, diretamente impactado pela conjuntura do País, Samuel Pessôa lança uma estimativa: "como o setor é um dos últimos a sair [das crises] porque o tíquete é alto, as coisas devem começar a andar até meados de 2020". Acompanhe a entrevista:

Olhando para os candidatos ao governo federal, na sua visão, qual deles, se eleito, implementaria as melhores propostas e teria maior potencial para efetivamente promover avanços na economia?
Creio que o melhor candidato seja Geraldo Alckmin. É um homem muito experiente e já fez a negociação com o centrão [PP, PR, PRB, DEM e Solidariedade]. Negociar antes é melhor. Quando se faz isso, consegue-se uma negociação mais programática. O que Alckmin fala é verdade: existe gente boa e gente ruim nos mais diversos partidos. Então, negociar previamente com base em um programa é o ideal – e o programa de Alckmin é arrumar as contas públicas, o que considero mais adequado.

Que presidenciável traria mais riscos nesse mesmo aspecto?
Não gosto da candidatura de Jair Bolsonaro, pois é um homem de um partido minúsculo e sem nenhuma experiência de [poder] Executivo. Não está claro para mim como ele vai negociar com as pessoas. Também não aprecio o PT, uma vez que é um grupo político que ficou muitos anos [na presidência] e é responsável direto por essa crise. Seria melhor o PT ficar na oposição por mais algum tempo. Não me parece produtivo esse partido voltar; porém, respeito o candidato Fernando Haddad e vejo qualidades nele. De todo modo, entendo que, independentemente de quem seja eleito, vamos encaminhar o problema fiscal porque não fazer isso gera custos muito grandes.

É, então, possível manter uma postura minimamente positiva com relação ao horizonte nacional, seja quem for o nome vitorioso?
Tenho certo otimismo com qualquer candidato. O problema maior, que é nosso conflito distributivo, vai rumar para uma solução. Ela pode mais ou menos satisfatória, mas, no futuro, teremos tempos melhores do que os que estamos vivendo agora.

Pode-se dizer, portanto, que o que vai ser feito pela próxima gestão federal já está dado e o que vai variar são apenas a forma e a velocidade de implementação?
Exatamente. Vamos necessariamente passar pela arrumação da casa fiscal.

O maior desafio para quem ascender ao Palácio do Planalto vai ser a articulação do ajuste fiscal junto ao Legislativo?
O grande desafio será processar o ajuste fiscal no Congresso Nacional. O ajuste significa aumentar impostos e reduzir gastos, abarcando os dispêndios com programas que atendem às necessidades da sociedade e os relativos à própria máquina administrativa e de servidores públicos – inclusive desembolsos previdenciários com servidores. Então, o ajuste vai envolver uma combinação dessas três coisas: aumento de impostos, redução de gastos com atividades-fim e enxugamento de gastos com atividades-meio. Essas medidas requererão aprovar leis no Congresso, em geral reformas constitucionais que exigem, em dois turnos, nas duas Casas, 60% [dos votos].

Na sua análise, qual seria a combinação ideal desses três componentes do ajuste? E a mais provável?
Isso é o que vai variar de candidato para candidato. Por exemplo, Mauro Benevides Filho, assessor econômico de Ciro Gomes, há algum tempo, sinalizou que seu ajuste fiscal seria muito via aumento de impostos – sobre distribuição de dividendos, incluindo empresas que estão no Simples; sobre heranças; via criação de uma nova CPMF vinculada a um objetivo de redução da dívida pública etc. A impressão que tenho é de que Ciro Gomes viria por um ajuste enfatizando o aumento de receita. Geraldo Alckmin, por sua vez, ficaria no meio do caminho. Já o desenho do ajuste fiscal de Marina Silva e Fernando Haddad não está claro.

E no caso de Jair Bolsonaro?
Ele fala muito de privatização, mas sabemos que isso demanda tempo. É preciso preparar a empresa, aprovar uma lei no Congresso... Leva um ou dois anos. Não resolve um drama imediato e também é uma medida de uma vez para sempre.

Não seria, portanto, uma solução continuada...
Sim. Além disso, a privatização deveria vir só depois da aprovação da solução continuada, que é o que vai dar expectativas positivas, garantir que se resolveu o problema. Aí, com a reversão das expectativas, o País volta a um clima bom e a crescer. Nessa esteira, as empresas públicas sobem de valor e tem-se um momento favorável para privatizá-las. Se a opção for privatizar para resolver a crise, vai-se vender na 'bacia das almas'. A ordem tem de ser inversa.

Essa é sua principal crítica às proposta do candidato que até aqui vem liderando a corrida presidencial?
Tenho muitas dúvidas em relação ao programa econômico de Paulo Guedes [assessor econômico e virtual ministro da Fazenda de Bolsonaro]. Ele é um economista muito respeitado e bem formado, com uma passagem exitosa no mercado financeiro. Contudo, olho o programa econômico dele e ainda não está nítido qual vai ser o desenho geral.

Como você vê o comportamento do consumidor ao mirar 2019, sobretudo com relação a decisões de compra de alto impacto, como a de um imóvel? Pode-se acreditar em destravamento ou é cedo para traçar qualquer estimativa?
Se minha aposta otimista se materializar, vamos, até meados de 2019, desenhar como resolver nosso problema político e nosso conflito distributivo, e a situação vai melhorar. Aí, com horizonte, a economia volta a crescer, gera-se renda, o endividamento das pessoas cai e as soluções se dão. Como o setor imobiliário é um dos últimos a sair [das crises] porque o tíquete é alto, as coisas devem começar a andar até meados de 2020.

Acredita na manutenção do programa MInha Casa Minha Vida, a despeito de mudanças políticas?
Esse é um programa que depende muito da situação do Tesouro Nacional. Se está sobrevivendo com o Tesouro tão ruim assim, então está dado. É um programa que o PT criou e a sociedade aprova. Uma política pública que ofereça unidades habitacionais a baixo custo para a população de baixa renda é importante. Creio, porém, que seu desenho teria de ser mudado, priorizando a reocupação dos centros das regiões metropolitanas. Esse aspecto precisa ser olhado com mais cuidado.

Quais as suas expectativas para 2019 no que toca a renda, crédito imobiliário e outras variáveis que afetam diretamente o setor de real estate?
Ainda vai demorar [para haver uma evolução]. Isso é algo para médio prazo. Há um nó a desatar. É muito dramático ter uma sociedade que não constrói um acordo entre ela sobre como o Estado arrecada e gasta. Isso é básico. Temos de negociar entre nós as bases tributárias e as obrigações do Estado. Se nosso sistema político não consegue fazer isso, o nível de incerteza para os agentes econômicos, do mais simples ao mais rico, é imenso e fica difícil se mexer.


Entrevista concedida à editora-chefe, Giovanna Carnio



 
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